Vazio de emoção
Um homem rezava a bíblia
Enquanto outro pedia perdão
Estão todos perdidos
Achando ter razão
Esperam pelo paraíso
Enquanto o mundo desaba
Temem a escuridão
E trancam-se em suas conchas
Achando que precisam
Desprazer em te conhecer
Não me venha com bom dia
Não minta novamente
Fico o mais longe que posso
Das certezas e respostas
Não suporto suas histórias
Pra você eu viro as costas
Então me teletransporto
Pro mundo da ilusão
Onde não existe
Essa maldita convicção
Mas ainda é como nadar
Naquele mar de giletes
Agulhas e estiletes
Perfurantes e cortantes
Arde como a vida
Dói como a memória
Não existe o tal futuro
Já não acredito em solução
...
Sem ponteiros
Um céu escuro
cinza e completamente sem luz
nesse frio insuportável
que congela nosso peito
e mata nossa alma
sufoca nosso grito
e ninguém entende
algo de tudo que falamos
e ainda tentamos explicar
mas já não temos tempo a perder
com ouvidos surdos
ou mentes enlatadas
Tudo o que resta
é o nada
sem cheiro, sem gosto e sem sentido
sem perspectivas e sem futuro
Nada mais faz sentido
E quando é que fez?
Os parasitas chegam pra sugar
o que ainda resta
e os carniceiros já aguardam os meus restos
e nossa existência inexistente
não permite que esqueçamos
do vazio que nos preenche
Estamos tão áridos
que nosso solo já rachou
Nada mais nasce aqui
nessa terra devastada
E até os cegos podem ver
mas eles também duvidam
Afinal
acreditar
virou apenas mais uma forma de mentir
É apenas a lembrança
dessas plantas
que há muito
já morreram
e não adianta mais regar
e não adianta querer dançar
se as pernas já caíram
Como ovos podres
eles tentam
nos convencer
que só querem ajudar
mas a vida já passou
e a memória se esqueceu
o tempo se arrasta
e a hora nunca chega
...
Não aguento mais
Não aguento mais
sem dinheiro no bolso
amor no coração
ideias que me convençam
ou ao menos uma ilusão
Apenas aguardo que me perfume
a doce fragrância da putrefação
...
O descer
Estou aqui
Me derretendo em fezes
Já escorreram as entranhas
E coisas que me parecem estranhas
Se foi isso que comi
Está cheio de moscas e vermes
É como uma corrente elétrica
Que percorre meu corpo
Causando convulsões e espasmos
Desligando meu cérebro
Parecendo o fim
Levando-me ao necrotério
Mas é apenas uma condição natural
Algo de nascença
Já me sinto fadigado
Minha cor esverdeada
Minha língua mordida
Minhas veias exaltadas
Os olhos ardem
E o gosto é amargo
Acho que isso é um pedaço do pâncreas
Acho que isso não é mais nada
Mas se isso não é meu fígado
Então é algum dente
O pulmão já é um saco preto
Murcho e sem vida
Parecendo uma uva passa mofada
Uma carcaça atropelada
Um monte de nada
Uma porra gozada
Sugado pelo buraco negro
Que consome a pouca energia que me resta
Jogam fora os meus restos
Dizendo que nada aqui presta
Que começará o funeral
Que comece a festa
Que se foda essa porra
gritava ao virar a mesa
atirando coisas para o alto
e coquetéis molotovs nos tanques opressores
que chegavam atropelando sua vida
Membros espalhados
decorando até o alto das árvores
Você sabe como funciona o circo
o horror apreciado em meio a papéis e supostas soluções
impostas por vampiros e maníacos que decidem quantos mais irão sofrer
Mas vamos lá
dizem eles que não estão lá
Vamos lá
repetem eles que não estão lá
E é nesse momento que João pega sua arma e mergulha no inferno
arrancando cabeças e destruindo vidas
o show não pode parar
Vamos João
um assassinato não é nada comparado a glória dos mortos
E é nesse momento que João encontra o cara dos molotovs
Ambos param ao reconhecer o irmão
Mas João não pode parar se não acabará o show
E toda aquela lavagem cerebral não poderia ter sido em vão
E o cara dos molotovs tentou acordar o irmão
mas João já havia morrido então
Era apenas um corpo com uma arma na mão
E o dedo treinado para disparar a munição
Mate seu irmão
Mate seu irmão
Mas os que planejaram tudo brindavam e comiam
Os que planejaram tudo riam e dançavam
enquanto o encontro fatal dos que sangravam
acontecia em meio a carnificina
Entranhas
ventres abertos
o show o
show o show
apenas
um grande negócio
Vamos explorar
invadir
e roubar o que conseguir
Mas a resistência
irá sangrar
sem nunca desistir
Eles não vão desistir
Eles não vão desistir
Até quando irão resistir?
Mande um reforço de Joãos para fortalecer o grande show
Mandem olhos que já não enxergam e consciências mortas
Ninguém precisa entender
O cheiro de pólvora e carne é o óleo da máquina de extermínio
Fechem os ouvidos
Causem pânico
Deixem de sentir
É apenas mais um filme de entretenimento
O arco-íris de fogo ilumina
enquanto eles gritam
Vamos lá João
Vamos lá João
Mate ou subjugue seu irmão
De preferência mate
De preferência mate
Homens transformados em máquinas
agem como bestas sedentas
A mente morta
já não pensa
Olá João
Lembra de quando éramos crianças?
Eles estão usando você contra os seus
Deveríamos estar lado a lado contra estes malditos hipócritas
1, 2, 3, 4
João já não pode ouvir
sentir
refletir
Já é um cadáver e não respira
LEMBRE
As balas já estão voando
contra os corpos
de seus iguais
...
Docinhos de fel
Quanto mais a vida passa
muito menos me agrada
Cercado por falcatruas mil
desde o dia em que nasci
aprendi a sobreviver
na selva oligofrênica
aprendi a odiar
Não gosto das pessoas em geral
Não vão me enganar
Aprendi a contestar
Aprendi a confrontar
Não vou me conformar
Não vou me encaixar
Querem me iludir
Querem me enquadrar
Mas não vou me acostumar
Não vou me acomodar
Eles mentem sem parar
Querem te adestrar
para torná-lo inofensivo
ou então acorrentar
Mas não vão me parar
nem o pensamento enjaular
Parem com esse papinho
que não vou acreditar
E você diz que me amarra
pra poder me proteger
E você diz que me castra
pra eu não enlouquecer
E me impõe suas verdades
E me empurra suas verdades
pela garganta abaixo
sem deixar minha voz
dizer o que penso
dizer o que acho
Aprendi a discordar
Aprendi a protestar
Até que me reste só a caveira
um crânio
uma ossada
irei resistir
Já não posso desistir
Impossível é continuar assim
Tudo chega ao fim
E essa estrada cheia de dor
desespero sem sabor
Já cortaram minha língua
e quebraram os meus ossos
Já furaram os meus olhos
e soldaram meus ouvidos
Mas ainda posso continuar
nem que seja a última coisa
nem que seja o último ato
Nunca me adaptarei ao sistema
prefiro ser mais um problema
que entrar no esquema
Ser uma afta incomodando
uma tensão sempre a pairar
Não abra mão
da sua capacidade de pensar
sem abandonar a imaginação
Se não pode ser questionado
fique alerta e tome cuidado
pois é mais uma armação
para te esmagar
imobilizar
domar
incapacitar
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