A história da mola
E quando os sedativos acabarem
e a realidade vomitar em sua cara
tudo o que acontece
neste mundo a sua volta
como um soco em seu nariz
e já não consegui fingir
que não tem nada a ver com isso
mesmo que aperte os olhos
e tape os ouvidos com toda a força
você já não é mais
capaz
e a mentira já não pode mais te proteger
O medo consumindo
até não sobrar outra opção
reação
Nenhuma decisão é fácil
mas algumas são inevitáveis
Apenas um momento
uma fração de milésimos
Uma fatia da madrugada
Tempo de silêncio total
O anúncio do fim do escuro
Estava trabalhando
Todo mundo parecia dormir
menos Aretuza
Esta já tinha feito de tudo
e procurava mais alguma coisa
para poder inventar
Coisa ruim
Caminhando descalço
pelos desertos escaldantes
cozinhando as solas dos pés
que já são tiras de bacon
bem passadas
em más passagens
em maus bocados
Tropeça apenas
em latões vazios
como seu interior
de onde já sai o zumbido
do oco recheado de coisa alguma
como aqueles casulos que jazem
secos e cobertos de imundícies
Não se sabe de onde vem
tanta sujeira a nos inundar
nesta solidão sem fim
que tem origem na incompreensão
ou na glândula biliar de algum demônio
responsável por nos impor
tristezas e suplícios devastadores até para o maior masoquista que se teve notícias
Criaturas
inconformadas
O seu horror pra mim
é tudo de mais belo
Não canso de admirar
O que lhe causa espanto
Mas a vida é mesmo assim
cada um do seu jeito
mesmo que alguns
não sejam de jeito nenhum
Já não acredito mais que tudo seja assim
E esse cansaço mórbido
implorando pelo fim
no suspiro final com vestido de cetim
Nem sei porque penso essas coisas
Nada disso faz sentido
Está além do meu controle
Conviver com tantas dores
Não sei pra onde vou
nem muito bem quem sou
Respostas não existem
As mentiras prevalecem
Pensamos em um plano extremo
Provocar um colapso sistêmico
Que apodreça as engrenagens
e derrube as paredes
Me perguntam por que sou
Respondo porque quero
Prefiro um jeito que não seja o seu
Dar uma cabeçada na parede não é tão ruim quanto parece
E o cheiro dos tiros e bombas
já criaram seus sabores
Meu corpo foi atingido
pelos que defendem os senhores
E agora é o gosto de sangue
E o corpo não se move
Tudo isso pra neutralizar
outra terrível ameaça
Mas em nosso querido covil
estamos reproduzindo ideias
Ampliando o questionamento
Proliferando toda dúvida
A história de mais
um
Acreditando em nada
Não conseguia escolher qual mentira seguir
Sem desejo de participar
Não conseguia sentir, ser ou estar
Sem cura para quem conseguiu perceber a farsa que sustenta este jogo de cartas marcadas
Não havia tratamento que o ensinasse a deixar de ver o que está a sua frente
Fingir ser forte só para causar boa impressão
Fingir ter fé só para encurtar o sermão
Fingir que a família vai bem só para retardar o fim do que se desintegra
Fingir que ainda existe para se camuflar entre os que seguem a regra
Tentou o médico mas só o que conseguiu foi aumentar seu tédio
Foi em algumas religiões mas nenhuma conseguiu o embalar ao som das suas enganações
Cada vez mais as coisas faziam menos sentido
Ele não queria estar
dentro
Não tinha redes sociais
Nunca usou pix ou uber
Aplicativo era uma palavra repulsiva
Estava completamente fora
desse mundo
de “facilidades” que escravizam,
esvaziam, limitam e controlam
Sempre se negou a fazer parte
Agora mais que nunca
O rebelde das letras
Não acreditava nas rimas
Mandou as redondilhas a merda
Não tinha paciência pra métrica
A tradição e antigas formas
lhe pareciam algo mais que chato
Brincava com as letras do seu jeito
mesmo desagradando aos que decoravam
toda aquela inutilidade de regras
Por mais que torcessem o nariz para sua produção
que era bom
era
Sobre aquilo que estávamos conversando ontem
Não acreditamos
na sua conduta e moral
Estamos caminhando
na contramão do seu normal
para destruir o seu ideal
hipócrita e limitado
Podem prender
Podem bater
Podem nos matar de fome e
sede
Sem um troco pra tomar
aquela da parede
Podem ignorar
Podem criticar
Podem torturar e
esquartejar
que não conseguiremos
deixar de ser
aquilo que somos
Tapete de farpas
Triste coisa é sofrer
dos males do coração
Desatina o sentir
Desorienta a razão
O peito sangra
e nem consigo perceber
A vida é dura
e se joguei foi pra perder
Já desisti até de sofrer
Quero me esquecer
me enlouquecer
me entorpecer
Desaparecer
Tentando me
refugiar onde não existe para ver se consigo me livrar
Quanta frustração
e melancolia
temperados com angústias e aflições
E ainda dizem que a culpa é sua
como se fosse uma questão de escolha
submersa neste fluxo em descontrole
Mas o tédio
e o desespero
mantém este desagradável cheiro
E você nunca será bem recebido
como aquela visita esperada
já que de seu corpo exala a fragrância errada
Tudo o que você falar
será considerada a mais pura besteira
já que a lógica imposta diz que você está sempre errado
O jeito é se afastar
sem nenhum humano encontrar
seria uma boa saída para deixar de atrapalhar
Mesmo não querendo sua companhia
eles vão aparecer para azucrinar
dando bom dia e dizendo querer ajudar
Que profunda e desagradável agonia
elevando ao máximo
seu nível de melancolia
Já que nem ao menos consigo me exilar
pegarei a vida e darei uma encarada em seus olhos sarcásticos
a sacudirei pelos ombros e gritarei basta
BASTA!!!!
Turbulência crítica
Os planos deram errado
e tudo o mais rompeu-se em escombros
diante da sua figura
Resta apenas o nada como trunfo
pois o curinga já foi decapitado
sob as leis que mantém tudo em seu devido lugar
Quando você olhar em volta
pesquisando cada centímetro cúbico
não vai encontrar as saídas cuidadosamente camufladas
Portas abertas apenas para alguns
bem nascidos
ou conhecidos de seu Fulano ou Beltrano
Com isso lhe resta a miséria
que o conduzirá rapidamente até este triste e amargo fim
coberto de desgosto e infelicidade
Não se sabe se é praga ou vítima de aparição
coisa de azar ou maldição
estarmos sendo aniquilados com a benção da indiferença
E assim segue o desastre
de geração em geração
sem saber para onde ir
Caminhando como cegos em tiroteios
sentindo o corpo se dissolver
ou correndo sem direção
Um misantropo hediondo por natureza
A solidão preenchendo
um ser tão vazio
quanto a existência
Um peito seco
rachado como a sola do pé
ou um solo árido
Não se sentia bem em grupos
ou se enquadrando em qualquer opção
Não sustentava rótulos
ou tinha convicções
Sozinho chegou
e mais sozinho ainda se foi
Por Fabio da Silva Barbosa
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