segunda-feira, 3 de maio de 2021

Uma provinha do que está por vir

 Conto que abrirá Fábrica de Cadáveres - Do forno ao moedor, novo livro de Fabio da Silva Barbosa. 

Em breve, pela Editora Merda na Mão

causa mortis

 Não sei se foi o frio, o cansaço, ou algo que o devorava por dentro, mas aquela noite estava o próprio gelo. O vento cortava, entrando por sua roupa. Parecia estar nu. Andava ziguezagueando pela calçada. Os braços cruzados, bem apertados contra o corpo curvado, todo encolhido. Não sabia se era pior o frio da madrugada ou da solidão, a fome de comida ou de existir, a sede de água ou de viver. Não lembrava a última vez que tinha comido, dormido ou bebido. Só podia andar daquele jeito estranho, tentando não congelar. Dia e noite = andar e andar. As casas trancadas, nenhuma janela aberta. Passou por um prédio com uma luz acesa no primeiro andar. Mesmo com a janela fechada, podia ouvir vozes e risadas. Devia ser uma festa.Comida e tudo. Deviam ter aquecedor. Parou para apreciar um pouco, mas logo o frio pôs novamente suas pernas em movimento. Tentava dobrar ao máximo os joelhos para dar passos altos. Era quase uma dança macabra daquele corpo esquelético coberto por trapos.   

No dia seguinte encontraram seu cadáver estendido sobre sacos de lixo. Motivo da morte? Ninguém sabe se foi o frio, o cansaço ou algo que o devorava por dentro. 


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