sábado, 23 de março de 2024

Hábitos Estranhos


Por Fabio da Silva Barbosa

 

Vivo em um tempo onde se cultivam hábitos estranhos, naturalizando toda forma de violência e repassando absurdos como se fizessem algum sentido. A ignorância, a estupidez, a alienação e a apatia são servidas como vitaminas no café da manhã de quem pode se dar ao luxo de tal refeição. A outra ponta é corroída pela fome, a miséria e a completa falta de tudo que se pode imaginar. Florescem atos de desespero, angústias e ódio extremo. Cada um adoecendo a sua maneira. As pessoas que trabalharam o dia inteiro e querem ficar até mais tarde na rua desfrutando do descanso e se seu momento de lazer, não têm permissão para escolherem o melhor momento de ir para casa ou ficar um pouco mais. Existem normas inflexíveis e arbitrárias, ordens inquestionáveis que dizem o exato minuto em que devem se recolher. Não há escolha. Um pesado aparato repressivo é deslocado até os pontos onde a vida noturna é mais efervescente e começam a retirar as pessoas das ruas, tocando para casa como gado para o curral. “Vai gado! Vai para seu curral! Amanhã tem de levantar cedo para trabalhar, gerar lucro e enriquecer ainda mais o patrão.” Os que não moram perto, ainda têm de ficar por um tempo que beira o infinito esperando o ônibus que muitas vezes não passa mais naquela hora e não há outra forma de chegar em casa. E o rolo compressor repressivo continua vindo pra cima, querendo intimidar e cumprindo seu bizarro dever de manter a ordem. “Tudo tem de estar em ordem. Temos de controlar as multidões para que continuem dóceis e submissas.” Os que estão no interior dos bares podem ficar um pouco mais, apenas serão fotografados constantemente, a distância, pelos agentes da maldita lei construída cuidadosamente para manter a todos presos, mesmo aparentemente livres. Ninguém está a salvo da terrível máquina de moer. Mas ainda piores somos nós que não nos deixamos abater e continuamos de pé. Toda violência só aumenta nossa raiva  e indignação. Ninguém é perguntado se pode ser fotografado ou dá qualquer outro tipo de autorização. Eles dizem que estão apenas fotografando os bares e não as pessoas que estão por toda a parte, povoando todo o seu interior que muitas vezes tem a parte dianteira aberta. Mas o argumento final é que isso tudo é para sua proteção. E olha que isso ocorre em bairros mais movimentados e centrais. Imagina o que acontece nos bairros afastados e periféricos, onde os moradores são mantidos isolados através da falta de transporte púbico, transformando a área onde vive uma grande quantidade de trabalhadores em um local de difícil trânsito e impossibilitando o acesso dessas pessoas ao resto da cidade. Nestes locais, onde muitas vezes os direitos mais básicos são negados, as denúncias sobre a brutalidade policial, torturas, estupros e assassinatos não param de surgir. Os processos já se avolumam há muito tempo, registrando um controle populacional brutal e perverso em cima de uma fatia extremamente vulnerável da população. Poderíamos aqui também elencar o extermínio dos indígenas, de trabalhadores do campo e da cidade, repressões brutais a manifestações e até a centros culturais que tiveram livros de suas bibliotecas apreendidos como provas. Mas tudo sempre é justificado pela ótica capitalista. Esta ótica justificava a barbárie desde os tempos mais antigos, em tempos de ditaduras declaradas e agora na pseudodemocracia.       

Sem comentários:

Enviar um comentário