quinta-feira, 13 de março de 2025

Calvário Pestilento

 

 

Abusada pelos pais

Ainda não tinha nove anos

Mamãe Mamãe

Pare de me bater

Papai Papai

Pare de me estuprar

Não quero que tirem meus olhos

Quero escutar

Não quero que tapem meus ouvidos

Quero respirar

Não quero que cubram meu nariz

Quero enxergar

Não venha me amordaçar

 

Conheceu as ruas

O parque dos horrores

A fome na sarjeta

Preconceitos e misérias

 

Foi recolhida pelo sistema

Começou o entra e sai dos abrigos

Adotada e devolvida

Como um produto com defeito

O ódio só aumenta

Olhava o futuro

Totalmente sem esperança

Via sangue e dor

Um céu cinza e horrendo

Cobria seus dias de calvário

Não confiar é a lei

Aprendeu muito jovem

Que ninguém presta

E que se apoiar em mentiras hipócritas

Não faz o menor sentido

Não acreditava em muletas

Não acreditava em nada ou ninguém

 

Mal completou os treze

Toda raiva e rancor

Nunca se acalmar

Estar pronta para reagir

Sobreviver na selva infernal

Rodeada de ferro e concreto

Resistir a pressão

Não perecer precocemente nas mãos das bestas feras

Para aos dezoito a cadeia conhecer

Não quero apenas sobreviver

Para ser devorada viva

A cada dia que as podres folhas do calendário caem

Marcando o fim de uma pena

Que nunca acaba

 

A felicidade é uma farsa

E a vida uma corrida mortal

Rumo a nenhum lugar

 

É fácil para eles dizer

Deixe isso para lá

É fácil para eles pregar

Vamos perdoar

Ainda teve a clínica psiquiátrica

E sua prisão química

Amarrada em uma cama

Eu ainda podia cuspir

Não acredito em diversão ou ilusões fabricadas para me enganar

São tantas amarguras

Que é difícil lembrar

Que é difícil esquecer

 

Por Fabio da Silva Barbosa


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