Abusada pelos pais
Ainda não tinha nove anos
Mamãe Mamãe
Pare de me bater
Papai Papai
Pare de me estuprar
Não quero que tirem meus olhos
Quero escutar
Não quero que tapem meus ouvidos
Quero respirar
Não quero que cubram meu nariz
Quero enxergar
Não venha me amordaçar
Conheceu as ruas
O parque dos horrores
A fome na sarjeta
Preconceitos e misérias
Foi recolhida pelo sistema
Começou o entra e sai dos abrigos
Adotada e devolvida
Como um produto com defeito
O ódio só aumenta
Olhava o futuro
Totalmente sem esperança
Via sangue e dor
Um céu cinza e horrendo
Cobria seus dias de calvário
Não confiar é a lei
Aprendeu muito jovem
Que ninguém presta
E que se apoiar em mentiras hipócritas
Não faz o menor sentido
Não acreditava em muletas
Não acreditava em nada ou ninguém
Mal completou os treze
Toda raiva e rancor
Nunca se acalmar
Estar pronta para reagir
Sobreviver na selva infernal
Rodeada de ferro e concreto
Resistir a pressão
Não perecer precocemente nas mãos das bestas feras
Para aos dezoito a cadeia conhecer
Não quero apenas sobreviver
Para ser devorada viva
A cada dia que as podres folhas do calendário caem
Marcando o fim de uma pena
Que nunca acaba
A felicidade é uma farsa
E a vida uma corrida mortal
Rumo a nenhum lugar
É fácil para eles dizer
Deixe isso para lá
É fácil para eles pregar
Vamos perdoar
Ainda teve a clínica psiquiátrica
E sua prisão química
Amarrada em uma cama
Eu ainda podia cuspir
Não acredito em diversão ou ilusões fabricadas para me enganar
São tantas amarguras
Que é difícil lembrar
Que é difícil esquecer
Por Fabio da Silva Barbosa
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